A última vez que eu te vi

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A boa moda carioca, este livro segue a melhor tradição literária produzida na cidade do Rio de Janeiro, como se sabe, durante séculos, palco histórico da capital política e cultural do Brasil. O romance de Marlos Bittencourt oferece uma trama que nos enleia e nos delicia desde o primeiro contato com o texto. O prazer do livro, seu saber-sabor ficcional, resulta de que ele opera na fímbria da ficção e da crônica. Leem-se as dezenas de capítulos do livro como se fossem um folhetim, esse gênero da literatura que no Rio, desde o século XIX, na então capital do Império, consagrou um Manuel Antônio de Almeida, com seu picaresco e irreverente personagem Leonardo, a narrar uma cidade que por sua vez remontava ao tempo histórico do rei D. João VI.

Mas a história a geografia sentimental do Rio que Marlos descortina nesse enredo são bem mais próximas e contemporâneas daquelas que hoje conhecemos, em especial a zona sul e o centro da cidade. Sua trama histórica remonta ao tempo presente, mas também ao período de arbítrio da ditadura militar e faz-nos, ante esse espectro autoritário daninho que volta a rondar o país, reconstituir pela imaginação ficcional aquela conjuntura, com seus fortes ecos na vida brasileira atual.

O livro deita raízes, como disse, em uma tradição literário-cronística que articula a vivência de personagens em meio à boemia, à política, ao jornalismo, ao futebol e ao amor. É por isso que, enquanto percorria essa narrativa, evocava, numa espécie de palimpsesto, o humor boêmio de escritores-cronistas como Lima Barreto, Marques Rebelo, Nelson Rodrigues, Fausto Wolff, Nei Lopes, Aldir Blanc e tantos outros dessa linhagem a que agora Marlos Bittencourt faz jus.

Até mesmo a evocação do filme “Bar Esperança – o último que fecha” (1983), do saudoso cineasta-ator Hugo Carvana, o deleite desta ficção é capaz de associar. E como não lembrar, durante as cenas da redação do jornal O Barricada, do filme de Glauber Rocha, “Terra em transe” (1967), com o ator Jardel Filho, que faz as vezes de jornalista, a comentar: “poesia e política são demais para um homem só”.

Trocando em miúdos, esta é uma obra que celebra o prazer da vida e o dever da leitura. Prazer, porque podemos ler esse romance na rede, na cama, na praia, no ônibus, na mesa de bar ou até mesmo, como eu o fiz, no gabinete de um sisudo escritório. Como diria Eduardo Galeano, é “o livro dos abraços”. Dever, porque seu significado também remete à necessidade e à missão de ler em tempos de negacionismo, de ignorância, de intolerância. Marlos resgata a fruição de um livro com força imaginativa autoral. Ao mesmo tempo, longe de ser um lenitivo edulcorado da realidade, aguça a consciência crítica do mundo de hoje, deste nos impele a agir, ante o calamitoso e o trágico ao nosso redor.

Bernardo Buarque de Hollanda é professor-pesquisador da Fundação Getúlio Vargas (FGV CPDOC)

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Autor

Marlos Bittencourt é carioca e publicou os romances Escravos do Jogo (2012), finalista do Prêmio João Saldanha, concedido pela Associação de Cronistas Esportivos do Rio (Acerj), e Don Juan de Cascadura (2015), ambos pelo selo Desfecho. Em 2020, pela Editora Penalux, publicou o romance Au revoir, Copacabana. Jornalista, passou pelas redações do jornal O Dia, Portal UOL, Globoesporte.com, Jornal dos Sports e Diário Lance!. Em 2013 foi convidado a fazer palestras no Placar Literário, painel oficial da Bienal do Livro do Rio.

Ficha técnica

Autor: Marlos Bittencourt
Revisão: Opera Editorial
Gênero: Romance
ISBN: 978-65-85058-12-4
Coordenação editorial: Célio Peliciari e Moacir Calarga
Capa e projeto gráfico: Moacir Calarga
Páginas: 286
Tamanho: 14 x 21 cm

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